segunda-feira, 10 de setembro de 2012

MANTENDO A IDENTIDADE DA IGREJA

A maior “instituição” do mundo, edificada por Jesus de Nazaré há mais de dois mil anos, denominamos Igreja (Mt 16.18). Naturalmente à Igreja descrita nos evangelhos não se trata de prédio, denominação ou associação legalmente registrada em cartório. Mas de pessoas advindas de variadas regiões – judeus ou gentios – do mundo. Pessoas que, muitas vezes, marginalizadas e ignoradas por outras cognominadas eclesiásticas, fazem e forma a igreja local numa determinada região geográfica. Antes de se pensar em prédio ou construções devemos atentar para o fator “pessoalidade”. Igreja não é um grupo alheio às demandas pessoais. O lugar onde reunimo-nos semanalmente em nome do Senhor só tem razão de ser porque é composto por pessoas de corpo e alma. Jesus exalava cheiro de ovelhas. Ele pensava e só importava-se com elas, as pessoas (Mc 6.34). Sim, pessoas, pessoas e pessoas. Pensemos em pessoas!
No mundo contemporâneo, as instituições basilares da sociedade ― tais como, famílias, igrejas, escolas e outras ― sofrem repentinas mudanças. Uma das mais graves é a eclesiástica. Indivíduos que pensam a Igreja apenas como mera instituição portadora de um conglomerado de rituais frios e secos ― o fisiologismo eclesiástico ― são tremendos parasitas. Servem apenas para sugar a sensibilidade humana dos crentes. Isso desencoraja qualquer um de levar a sério o Evangelho que proclamamos como a melhor mensagem do mundo. Ora, se não há coerência entre o que falamos e fazemos como podemos esperar alguma resposta positiva em relação à Boa Notícia que anunciamos? Ela só é Boa Notícia quando o portador desta revela a sua coerência com a própria vida. Se não for assim, não podemos nem prosseguir em nossa jornada discipuladora. Do contrário será comum ouvirmos expressões ― E quem nunca as ouviu? ― “A igreja de hoje não é mais a mesma!”; “Ah, ela perdeu a sua Identidade. Mas, afinal de contas, o que se quer dizer com a expressão “a igreja perdeu a sua identidade?”
O dicionário de língua portuguesa, Caldas Aulete, chama identidade “o conjunto de características próprias de uma pessoa, um grupo etc. e que possibilitam a sua identificação ou reconhecimento”. A partir deste conceito, sabemos que o verdadeiro caráter de uma pessoa desnuda absolutamente o seu ser. Não há o que esconder. Ela é o que é na frente ou na ausência de qualquer indivíduo. Quando a mente e o coração estão impregnados da essência do Evangelho, somos acometidos por uma consciência avassaladora a ponto de mudarmos pensamentos, desejos e vontades do coração. Aqui, ocorre a Metanoia ― uma revolução da mentalidade, um novo pensamento. Pois o Evangelho é “o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16)!   
A Igreja de Cristo possui uma identidade pela qual é reconhecida desde os primórdios temporais: o Amor (Jo 13.34,35). À luz do capítulo 2 do livro dos Atos dos Apóstolos podemos averiguar a prática vertical e horizontal desse amor: Deus e o próximo. O Texto Sagrado a confirma no versículo 42: Preservação do Ensino (Evangelho); Comunhão entre irmãos; Serviço ao próximo. São estas as características que formaram a identidade da Igreja apostólica. E têm elas muito a nos ensinar. Todavia, algumas perguntas são inevitáveis. Como identidade, o que se pretende preservar? No que concerne à Igreja, de que identidade está se falando? A do Evangelho ou a temporal? Que identidade procuramos assegurar? A da Igreja que serve o próximo ou daquela que serve-se do próximo? Que identidade queremos manter? A de Cristo? Então deve-se deixar bem claro: é preciso que o Evangelho de Jesus permeie a mente e o coração daquele que se diz seu discípulo. Doutra maneira, não passaremos de pessoas apegadas a uma identidade forjada nas raias das tradições humanas e que nada têm haver com as Boas Novas de Jesus. Cada um examine-se a si mesmo! Pois não há identidade mais fiel ao meigo nazareno do que essa: “com isso todos saberão que vocês são meus discípulos, se vocês se amarem uns aos outros” (Jo 13.35 – NVI).
O amor do Pai impele pessoas comuns sem preconceitos de cor, sexo, classe social e etnia a proclamar Jesus como o Deus encarnado, mas humano também; que morreu e ressuscitou. E agora está a destra do Eterno amando com mui grande amor cada criatura humana. Nele não há acepção de pessoas. Ele as ama infinitamente além do que se pode pensar e imaginar. O amor de Jesus constrange-nos à prática do amor pessoal e mútuo à sociedade onde vivemos.
Não há maior desserviço para o Evangelho do que proclamar uma mensagem como verdade que não o é para nós. Não pode haver fingimento com Jesus. Pode-se disfarçar no ritual eclesiástico. Dissimular por trás do púlpito. E declarar até uma verdade, mas com pressupostos de mentiras. Com trajes de piedade, aparência de espiritualidade e porte de quem conhece todos os mistérios transcendentais. Tudo isso, no entanto, não quer dizer nada para Jesus. O ensino do meigo nazareno desconstrói as aparências e as construções da religião humana pelo simples fato: Nele, habitam a verdade e a sinceridade. Por isso o proclamamos como o nosso Emanuel. O exemplo de Jesus de Nazaré impele-nos a viver o seu estilo de vida deixado para todos quantos o ouvem: Amar e Servir o próximo (Mc 12.31).  Apresentamos Jesus como Àquele que conduz o homem, da escravidão do pecado, a comunhão coletiva e libertadora de sua Igreja (duas ou mais pessoas, comunidades e assembleias espalhadas pelo mundo).
Dito isto, digo com verdade e não minto: manter a identidade da Igreja não significa manter os caprichos eclesiásticos humanos. Não é fazer a manutenção das estruturas de poder e, muitos menos, de poderosos sistemas que insistem em impedir o florescimento do Evangelho no coração das pessoas mais simples (Mt 23.13). Você pode me perguntar: Mas, como assim poderosos sistemas contra o florescimento do Evangelho? E eu lhe respondo: tudo o que não visa libertar o ser humano da opressão humana é contra o espírito do Evangelho. Tudo o que não leva liberdade a pessoa em Deus e perante os homens é contra o espírito de Cristo. O que não promove vida, realização humana e sinceridade das entranhas são contra o espírito de Jesus de Nazaré.
Note, o prezado leitor, que você não encontrará palavras de Jesus que não faça brotar vida em abundância. E abundância aqui não é a perspectiva mundana de prosperidade, mas a do Evangelho. Este confronta-nos e desafia-nos a mexer na estrutura total da vida. Nosso estilo de viver ― gostos, consumos, lazer, entretenimento, trabalho, etc. ― é diretamente confrontado com o de Jesus. Não há como ficar indiferente a Ele. A não ser que forcemos a cauterização da consciência. Pois tudo o que não partir da consciência pessoal do Evangelho para nada presta. A vida de Jesus, segundo os Evangelhos, é construída por consciência. Jamais por conveniência!   
Acredito que vivemos, no Brasil, um dos tempos mais difíceis no arraial do que chamamos “Igreja Evangélica Brasileira”. Em muitos lugares quando se tenta viver o espírito do Evangelho, recebe-se a pecha de herege. Quem usa desse subterfúgio para fazer calar a voz profética do Evangelho, esquece-se de que em relação ao sistema corrompido do judaísmo Jesus também foi cunhado de herege. Não só cunhado, mas condenado em primeira instância, por homens da religião e autoridade romana, a pagar com a própria vida pela verdade que afirmou: Eu Sou Deus (Mt 16.16,17). De fato, eles não aguentam o grito, a voz e o ressoar do Evangelho. Este denuncia, tira a sujeira debaixo do tapete, fala a verdade e confronta-nos a inverdade que habita em nós.
Portanto, proclamemos a pessoa de Jesus com poder, mas vivamos a comunhão com graça e pratiquemos o serviço ao próximo como verdade daquilo que dizemos. No final sobrará apenas uma identidade: Aquilo que eu pratico se verdade for, o que eu falar verdade será; pois o amor que brota do coração de Jesus em nossos corações verdade é. Então, podemos afirmar a verdade do amor a Cristo na ousadia do apóstolo do amor: “Amamos o Senhor porque ele nos amou primeiro” (1 Jo 4.19).  Amemos, Amemos!

M.O.O.
Rio de Janeiro, RJ.